Agora estou aqui. Em casa. Meio passando mal, meio não. Estava com enjoo até agora a pouco. Foi muita emoção. Muita ansiedade. Hoje fiz a primeira filmagem do ensaio. Passei o feriado inteiro ansiosa. Assim, meio doida. Meio alheia aos assuntos. Dentro da minha cabeça ficava ouvindo as músicas, passando os textos, vendo as cenas… e o pior: colocando defeitos. Em mim. E me preocupando pois achei que o trabalho ainda não estava maduro o suficiente para fazer a filmagem.

Mas deu tudo certo. Agradeço a todos que me ajudaram: Makely, Gabriel, Jorge e Mário. Agradeço profundamente a Elaine Reis, que me apoia oferecendo o Studio It para meus ensaios. E foi onde filmei hoje. Agradeço à professora de ballet, Iara, que não se importou em ir para outra sala, pois minha gravação se estendeu um pouco além do horário… Com essas pessoas assim me ajudando… fica mais leve. É  impossível trabalhar sozinho. Precisamos uns dos outros.

Dos meus quatro solos, este é sem dúvida, o mais difícil. O mais pesado. O mais complexo. Se bem que todos foram muito difíceis, cada um na etapa de vida e experiência artística em que foi construído. Os quatro doeram muito. Nos quatro chorei muito. No processo de criação de cada um dos quatro confundi realidade com criação.

Mas de todos Angelina é o que está dentro de mim há mais tempo sendo gerado. Uma gravidez de uns 10 anos… Eu entrei no universo do palhaço para fazer um trabalho mais leve, onde pudesse rir de mim mesma. Os três solos da Trilogia do Feminino são muito densos. Não que isso seja ruim, amo fazer cada um. São partes da minha Alma. Foram criados com amor e angústia. Cada um dos três nasceu para que eu continuasse vivendo.

Só que agora eu precisava de um pouco mais de ar. Mas sinceramente… não acho que foi leve o processo da Angelina (meu companheiro que o diga, aliás, ele teve muita paciência comigo). E ainda não sei muito o que dizer sobre o trabalho. Mas não é leve. É denso. Os assuntos da obra me perturbam. Batem em minhas paredes e ricocheteiam dentro de mim. A sensação que tenho é que Angelina pega um tapete que tinha muita sujeira debaixo dele e o levanta. Ela limpa o chão ali. Ela varre. Varre. Varre. Angelina levanta assuntos. Discorre. Filosofa. Pensa. Alfineta. Ri. Chora. E ama. Angelina ama profundamente. O quê ou quem? O quê e quem tiver para amar, ela ama. Vai amando…

O trabalho ainda tem muitos ajustes a serem feitos, mas sem dúvida, está na etapa final. Agora é ensaiar. Ensaiar. Ensaiar. Deixar o texto se resolver e expulsar naturalmente as sobras. Deixar o movimento vir e naturalmente se fixar. Hora de me apropriar. Hora de criar resistência física para dançar, falar, cantar. Este é o momento para desenvolver minha segurança de que dou conta de fazê-lo. Ter controle da respiração. E isso é ensaiando. Ensaia-se até o espetáculo ficar natural. Até ele deixar de ser um monstro que pode te engolir. Ensaia-se para ter as rédeas do trabalho nas mãos e então começar a se divertir com ele.

Dá uma ansiedade muito grande pensar como este solo vai reverberar nas pessoas… mas isso é algo que artista nenhum pode controlar. Precisamos nos “despir”. Nos expor. E arriscar. Por isso é tão importante que a primeira pessoa a acreditar na obra seja o próprio artista. Se o artista desfruta, se ele sente prazer, isso trará no mínimo, verdade ao espetáculo.

Quando crio me preocupo com público. Me lembro que ele estará li, assistindo. Mas em primeiro lugar vem o meu crescimento pessoal com o processo de criação. Acredito que se eu mergulhar e realmente descobrir algo que me transforme, então terei algo para dizer em cena.

Agora estou aqui. Em casa. Meio passando mal, meio não. Estava com enjoo até agora a pouco. Foi muita emoção.

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Foto: Makely Ka